Quando não morrem, vítimas sofrem sequelas nos acidentes de moto. Foto: Thalyta Tavares/DP |
Trinta e cinco dias de internamento. Doze dias na UTI. Cinco ossos quebrados. O agricultor José Romário Silva só lembra que estava de tarde. Ele voltava para casa depois de fazer compras em Caetés, Agreste, quando sentiu uma forte dor no peito e, atordoado, perdeu o controle da moto. Bateu num caminhão e perdeu a consciência. Acordou num leito de hospital, sem poder se mexer. José Romário tem 20 anos, nasceu na era dominada pelas motocicletas. É o retrato de uma curva sem retorno na mobilidade, que completará, em 2019, duas décadas sem solução.
O número de vítimas de acidentes de moto em Pernambuco permanece em ascensão. Entre 2016 e 2017, houve crescimento de 6% nos acidentados. Foram 31,1 mil vitimados no ano passado, 1,7 mil pessoas a mais. Já a elevação no número de acidentes ocorre há, pelo menos, três anos. Entre 2015 e 2016, foi de 11%, uma diferença absoluta de quase três mil acidentes. Por dia, no ano passado, os 17 hospitais sentinelas pernambucanos (onde são feitas as notificações) registraram, por dia, 85 novos acidentados por moto.
Esse incremento converge com outro dado alarmante. Depois de apresentar queda entre 2015 e 2016, o número de pessoas que tentaram tirar carteira de habilitação para moto em Pernambuco voltou a crescer 30% no ano passado, em relação ao mesmo período do ano anterior. “Os avanços foram pontuais. A epidemia está aí, matando e deixando pessoas amputadas, sem nenhum ponto de inflexão”, pontua o coordenador executivo do Comitê Estadual de Prevenção aos Acidentes de Moto (Cepam), João Veiga.
Ele mostra que dois momentos históricos foram determinantes. O primeiro surgiu na virada dos anos 2000. “Começamos a perceber uma mudança no perfil dos atendimentos nas emergências, com o paciente vítima de acidente de moto aumentando de maneira geométrica”, explica. O crescimento, segundo destaca o Mapa da motorização individual no Brasil, divulgado em setembro de 2017 pelo Observatório das Metrópoles, teve correlação com a pujança econômica do país e as desonerações fiscais de impulso de vendas dos anos seguintes.
O segundo momento ocorreu em 2009, ano no qual o Diario publicou caderno especial, vencedor do Prêmio Esso de Jornalismo, mostrando a seriedade do quadro. “O problema deixou de ser o quinto a chegar às emergências para ser o primeiro, passando agressões por armas de fogo, por exemplo”, lembra Veiga. Para ele, a justificativa foi a aprovação da Lei Federal 12.009, de regulamentação do serviço de mototaxista no país.
Entre 1999 e 2009, a quantidade de pessoas que tentaram tirar habilitação para moto em Pernambuco aumentou 16 vezes. Já o número de emplacamentos aumentou 73%. “Até então, tínhamos a taxa de uma vítima por acidente. Depois disso, passou a ser de 1,7 vítima por acidente.”
Entre 2006 e 2016, morreram em Pernambuco 13 mil vítimas de acidente de moto, aumento de 48% em uma década. Entre 2015 e 2016, o aumento foi de 5%. José Romário começou a pilotar aos 16, após dois anos juntando dinheiro para a moto. “É uma adrenalina boa, mas agora, Deus me livre”, garante, enquanto faz força para tentar mexer as pernas, num leito do Hospital da Restauração.
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